domingo, 21 de agosto de 2016

ENTRE PIOLHOS E LÊNDEAS


Por Carlos Delano Rebouças

Sentada em um tamborete, Dona Isaura diariamente seguia a sua rotina de catar piolhos e lêndeas nas cabeças de seus netos e até, nas outras crianças do seu bairro.

Muito mais que uma forma de minimizar a incidência do parasita no couro cabeludo das crianças, tratava-se de um passatempo para aquela senhora de 73 anos, que apesar de sua idade, tinha um espírito jovial, que a levava a sua infância, sempre que acolhia uma criança entre suas pernas, munida de seu pente, escova e tantas histórias a contar.

Era realmente um momento único para a Dona Isaura, que hoje está sepultado diante da tecnologia, dos equipamentos portáteis que permitem uma viagem pelo mundo virtual, cibernético.
E como Dona Isaura, tantas outras insistem em manter viva essa cultura, mesmo que seja na matança de piolhos e lêndeas. Quantas ainda vemos sentadas nas calçadas, proseando, como se diz no interior do  Brasil, e, entre um estalo e outro, nas brechas abertas dos cabelos partidos pelos pentes, no paciente ofício de catador de piolhos, muitas histórias são contadas.

Lembro até que um dia, assistindo a uma matéria na TV, vi que existem profissionais catadores de piolho, que sobrevivem do ofício, acreditem.

Certamente, Dona Isaura não é assim; ela somente encara a atividade como uma rotina de vida, que vem desde a sua infância, quando era uma dessas crianças, piolhentas, que não se vê bem menos hoje em dia. Faz parte de alguns poucos remanescentes que relutam na manutenção de uma cultura, que precisa somente de um pente fino, uma escova, uma toalha branca, e uma cabeça repleta de piolhos, e sem um sinal de internet, para não desviar as atenções.


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